Perto de casa há um templo da Universal. Distribuíam um jornal cujo nome não me vem e não é importante lembrá-lo.
Passo pela mesa. Uma moça sai em busca de seu alvo. Parte com o sorriso de quem conhece o paraíso. Anda três passos e pede um minuto: "o senhor já é evangélico?". O que responder? Penso em uma resposta diferente; acaba saindo um simples "não".
Ela tenta me cativar. Eu, ir embora. Faltava alguma coisa nela. Na verdade, sobrava. Era a evidente perturbação que trazia, uma angústia retida de saber o que se é e ainda se perguntar: é tão simples assim?
Alertou-me sobre o dia seguinte. Nenhuma previsão catastrófica, apenas um culto que haveria de ir. Se quisesse me salvar, pensei. Ela me surpreendeu: "se quiser que Jesus te salve". Pensei sobre a passividade que seria aquilo, receber a graça do redentor, e depois ao sair da igreja, ser feliz. Era uma fórmula simples e imediata, como os dias atuais. Vendia bem.
Eu falava com qualquer coisa menos com ela. Imaginava, entre uma pausa e outra que ela dava o que se escondia por trás daquela fala, daquele olhar. Quem seria essa pessoa se fosse eu a questioná-la sobre os caminhos da salvação? Como será que ela fazia sexo oral? Será que roncava à noite? E a bundinha, será que libera?
Por pouco vacilei, acreditei nela, em sua fé. Desejei ter uma igual. Mas não era ela que falava, talvez o livro, o pastor, até mesmo, o altíssimo, menos ela. Preferi minha liberdade limitada à sua eterna.
Para encerrar disse com meu sorriso característico: sim, eu irei, conte comigo! Se ela não estivesse tão afoita em cumprir sua missão, talvez agora eu seria mais evangélico chato e qualquer dia desses iria te abordar em uma esquina. Mas o Senhor quis que eu continuasse a não ser nada e a vagar por aí em busca de um sinal para minha salvação, que naquele dia, quase foi aquela moça, que transbordando de verdades por todos os poros conseguiu me salvar ao contar, sem querer, uma mentira simples.
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